A exploração dos trabalhadores submetidos a situações análogas à escravidão, em áreas rurais e urbanas, será investigada durante os próximos 120 dias pela CPI do Trabalho Escravo, instalada na Câmara dos Deputados nesta quarta-feira (28).
Com presidência do deputado Cláudio Puty (PT-RJ) – que propôs a instalação -, e relatoria do deputado Walter Feldman (PSDB-SP), a CPI pretende analisar a situação dos trabalhadores, rever a legislação vigente, e propor ações com o objetivo de erradicar o trabalho escravo no país.
“Não podemos admitir que trabalhadores continuem a ser privados de sua liberdade, e submetidos a situações humilhantes e degradantes em seus ambientes de trabalho. Essa chaga, que tem o nome de trabalho escravo contemporâneo, precisa ser banida de nosso país”, destaca o procurador do Trabalho Jonas Moreno, coordenador nacional de erradicação do trabalho escravo.
Ele ressalta que o Ministério Público do Trabalho irá fornecer todos os dados necessários para auxiliar as investigações da CPI. “Precisamos da ajuda de todo o poder público e da sociedade civil para acabar com a exploração dos trabalhadores”, ressaltou.
O trabalho escravo contemporâneo foi reconhecido pelo estado brasileiro em 1995, pelo presidente Fernando Henrique Cardoso. Inicialmente, a área rural representava o principal foco a ser combatido. Mas há cerca de dez anos o número de trabalhadores encontrados em áreas urbanas vem crescendo. Em 2011, centenas de estrangeiros foram resgatados em operações do Grupo Móvel (composto por representantes do MTE, MPT e Polícia Federal), principalmente em pequenas oficinas têxteis.
Atualmente 294 empregadores, entre pessoas físicas e jurídicas, compõem a Lista Suja do Trabalho Escravo, criada pela portaria 540/2004 do Ministério do Trabalho e Emprego. Todos foram autuados por submeterem trabalhadores a situações análogas à de escravo. Mas a constitucionalidade da lista está sendo questionada em ADI no Supremo Tribunal Federal – de relatoria do presidente eleito, ministro Carlos Ayres Brito.
No Senado, o PLS 25/05 do senador Pedro Simon (PMDB-RS) pretendia transformar em lei a lista suja, mas foi arquivado em janeiro de 2011. A proposta tem regras parecidas com as da portaria do MTE, e estabelece que a inclusão do nome do infrator deva ocorrer somente após o trânsito em julgado do processo administrativo decorrente do auto de infração.
Já na Câmara dos Deputados, a PEC 438/01 – que prevê a expropriação de propriedades rurais ou urbanas onde foi encontrado trabalho análogo ao de escravo – deve ser votada no próximo mês, conforme anunciado pelo presidente da Casa, deputado Marco Maia.
O trabalho escravo no Brasil.
Um estudo realizado, em 2011, pela Organização Internacional do Trabalho (OIT), alertou que a escravidão contemporânea no Brasil é precedida pelo trabalho infantil: 92,6% dos trabalhadores resgatados iniciaram a vida profissional antes dos 16 anos, sendo que 40% começaram a trabalhar aos 11 anos.
Outro problema apontado é a baixa escolaridade dos trabalhadores: 18,3% dos entrevistados eram analfabetos, e 45% analfabetos funcionais, com tempo médio de estudo de 3,8 anos. Consequentemente, a maioria (85%) não possuía qualquer qualificação profissional.
Sem qualificação, o trabalhador se torna suscetível a novo aliciamento: 59,7% já haviam passado por situação semelhante; e 12, 6% já tinham sido resgatados pelo Grupo Móvel.
Ainda segundo a pesquisa, o sentimento de inferioridade, discriminação e desvalorização social são predominantes entre os trabalhadores, como registra depoimento de um dos entrevistados: “Até o olhar das pessoas é diferente para a gente. Tratam como se fosse uma coisa qualquer, como um objeto de precisão. Precisa dele, põe pra cá. Não precisa, vai pra lá.”
Dados do Ministério do Trabalho e Emprego revelam que, nos últimos 15 anos, 39.169 trabalhadores foram resgatados em 2.840 estabelecimentos. Os empregadores tiveram de pagar R$62milhões em verbas salariais individuais. Em 2010 foram resgatadas 2.628 pessoas, um crescimento de 400% em relação a 2000 (516 resgatados). Também aumentou o número de estabelecimentos inspecionados – na grande maioria propriedades rurais – 88 em 2000 e 309 em 2010. O maior número de trabalhadores resgatados ocorreu em 2003 (6.137 pessoas).
Fonte: Procuradoria-Geral do Trabalho
EcoDebate, 30/03/2012
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